livro revela detalhes inéditos do triânlo amoroso entre o imperador do Brasil, a imperatriz Leopoldin e a marquesa de Santos.
D. Pedro enviava pelos pubianos e desenhos eróticos para a amante
Anderson Dezan, iG Rio de Janeiro
Um imperador inconsequente, uma imperatriz isolada e,
entre os dois, uma mulher segura de si. Assim a historiadora Mary del
Priore classifica os três personagens principais de seu novo livro, “A
Carne e o Sangue” (Editora Rocco). A partir de cartas inéditas
encontradas no Museu Imperial, na cidade de Petrópolis (RJ), a obra
retrata sob um novo olhar o triângulo amoroso formado por D. Pedro I, a
imperatriz Leopoldina e Domitila de Castro, a marquesa de Santos, e os
impactos políticos causados pelo romance. Confira: Leia o primeiro capítulo do livro "A Carne e o Sangue"
Foto: Divulgação
Capa do livro "A Carne e o Sangue"
De acordo com a autora, entre as descobertas sobre essa
história já conhecida estão detalhes íntimos da relação existente entre o
imperador e Domitila, carinhosamente chamada por ele de Titília. Em
correspondências trocadas por ambos, D. Pedro assinava como “Demonão” ou
“Fogo Foguinho”.
“Nunca vi, nem em correspondências estrangeiras publicadas, cartas
tão apaixonadas e derramadas. O tempo todo ele relembrava a vontade que
tinha de estar nos braços dela ou as noites de prazer que passavam
juntos. Quero ir aos cofres. Era essa a expressão que ele usava”, conta a
historiadora.
Os bilhetes encontrados também revelaram, segundo Mary del Priore, a
força e o poder que a marquesa de Santos possuía na vida de D. Pedro. Em
uma das correspondências, o imperador escreveu: “Quero que vá para São
Paulo”. “Vou quando eu quiser”, ela respondeu. “Estou mandando-lhe um
cavalo”, enviou o monarca. “Seu cavalo vai ficar pastando no meu
jardim”, retrucava Domitila, descrita como bela, com pele acetinada e
sem marcas de varíola, uma massa de cabelos escuros e brilhantes e uma
boca pequena, mas “bem mobiliada” de dentes.
“Domitila não media palavras. Você vê a solidez de uma relação
pautada pela intimidade, que não respeita hierarquia e nem regras de
etiqueta”, avalia a autora. “Ela era fruto de um meio. São Paulo na
virada do século 18 era uma cidade sem homens, que estavam nas minas ou
lutando contra os espanhóis. Isso forjou uma população feminina muito
autônoma e de uma disponibilidade sexual que na corte era escondida. A
marquesa de Santos não era uma piriguete e, sim, uma mulher segura de
si, do que queria e do seu corpo”. Imperatriz solitária
Foto: Divulgação
Imperatriz Leopoldina
Se as cartas inéditas utilizadas em “A Carne e o Sangue” revelam
uma postura vigorosa e autônoma da marquesa de Santos, por outro lado,
elas também apresentam uma Leopoldina solitária e abandonada. Um perfil
bem diferente de como os livros escolares a descrevem - como uma
participante ativa na vida política brasileira. Mary del Priore
encontrou cartas escritas pela imperatriz no final da vida que revelam
uma mulher que fala da sua depressão e seu sofrimento psíquico
decorrentes do adultério do marido. Leia também: Dez lições para escrever um livro de sucesso
“Isso jamais havia sido tratado. A imperatriz descobriu estar em uma
relação conjugal onde exercia o exclusivo papel de reprodutora. Ela não
conseguiu conjugar nenhuma ligação de espírito e alma com D. Pedro e foi
se afastando progressivamente do cenário social”, diz a autora. “Nas
cartas, Leopoldina dizia ter horror a sexo. Achou que o imperador fosse
gostar dela por suas qualidades morais, não pela cama e nem pela beleza
física”.
Um dos episódios mais dramáticos na vida da imperatriz – cansada das
traições do imperador – é descrito no livro. Com a morte do pai de
Domitila, D. Pedro desapareceu do palácio e foi para a casa da marquesa
para consolá-la. Leopoldina escreveu, então, para o pai, o último
soberano do Sacro-Império Romano-Germânico e imperador da Áustria,
Francisco I, pedindo para ir embora. “Estava em desespero total. Mas D.
Pedro contornou a situação, passou algumas noites com ela e deu um anel
com corações entrelaçados”, relata Mary del Priore. Inspiração equivocada
Quando se casaram, D. Pedro tinha 19 anos e, Leopoldina, 20. Ela,
descrita como uma moça gorda, bochechuda, com olhos azuis brilhantes,
mãos rechonchudas, pele cor de creme, nem bonita e nem feia, queria um
companheiro para tocar música, fazer caçadas e empalhar bichos. Ele era
conhecido pelo assédio que fazia às mulheres. “Nenhuma mulher se negava a
D. Pedro, não só por ser príncipe, mas por ser fogoso”.
Foto: Divulgação
D. Pedro I
Seu relacionamento com Domitila teve início em agosto de 1822,
durante uma viagem a São Paulo para acalmar os ânimos do governo da
província. O imperador já havia rompido com Portugal ao dizer que
ficaria no Brasil. Com o aumento da intensidade da relação, Dom Pedro
decidiu levar a concubina e os filhos de seu primeiro casamento para a
corte, dando-lhe o título de marquesa.
“Inspirado em monarcas como Luís XIV, D. Pedro decidiu levar para a
praça pública sua vida privada. A vida sexual dos reis era sinônimo de
força e virilidade no Antigo Regime, mas o movimento liberal da
Revolução Francesa acabou com isso. De forma atrasada, o imperador
transferiu esse costume para o Brasil e focou na Domitila, mas não
contava com a reação do povo”, conta Mary del Priore.
Com o romance extraconjugal escrachado, o povo se opôs a D. Pedro e
Domitila passou a ser tratada como inimiga número 1 de todos. Quando
Leopoldina morreu, as pessoas pensaram que a marquesa de Santos a havia
envenenado e foram até sua casa para apedrejá-la.
“Mesmo Luís XIV, que teve todas as amantes do mundo, dormia toda a
noite com a própria mulher e jamais perdeu o respeito público por ela.
Não era o caso do imperador D. Pedro”, avalia a historiadora. “O
imperador dizia que fazia amor de matrimônio com a Leopoldina e amor de
devoção com a Domitila. Ele separava bem a carne do sangue, o que
justifica o título do livro”. Enfraquecimento político e término do romance
Devido ao romance com Domitila, D. Pedro enfrentou problemas em
encontrar uma segunda esposa, após a morte da primeira. O pai de
Leopoldina o chamou publicamente de canalha e tentou barrar todas as
princesas austríacas ou alemãs de se casar com ele. Para amenizar a
situação, a marquesa de Santos teve que ser afastada do Rio. “D. Pedro
pediu para ela fingir que tinha ido e disse: isso é só para eu arranjar
uma mulher. Depois você volta”, conta a historiadora. Leia também: "O Dom Pedro de Portugal não tem nada a ver com o do Brasil"
Ele só conseguiu casar com Maria Amélia, uma jovem que não era
princesa de sangue, sem prestígio na Europa. “Desse ponto de vista, ele
não fez um bom casamento. Mas quando viu chegar uma menina linda de 16
anos, ele que era um verdadeiro ‘womanizer’, pirou. Isso foi o que
definiu a derrocada da marquesa de Santos”, relata Mary del Priore.
“O insucesso da Guerra Cisplatina, o fato dele se tornar cada vez
mais autoritário e a dissolução da Constituinte, somado a essa vida
escrachada colaborou para que ele voltasse a Portugal, abdicando o trono
para D. Pedro II. O imperador calculou mal suas ações e foi
inconsequente”, finaliza a autora.
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